José Bonifácio de Andrada e Silva (Santos, 13 de junho de 1763 —
Niterói, 6 de abril de 1838) foi um naturalista, estadista e poeta brasileiro.
É conhecido pelo epíteto de "Patriarca
da Independência" por ter sido uma pessoa decisiva para a
Independência do Brasil.
Pode-se
resumir brevemente sua atuação dizendo que foi ministro do Reino e dos negócios
estrangeiros de janeiro de 1822 a julho de 1823. De início, colocou-se em apoio
à regência de D. Pedro de Alcântara. Proclamada a Independência, organizou a
ação militar contra os focos de resistência à separação de Portugal, e comandou
uma política centralizadora. Durante os debates da Assembleia Constituinte,
deu-se o rompimento dele e de seus irmãos Martim Francisco Ribeiro de Andrada e
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva com o imperador. Em 16 de
julho de 1823, D. Pedro I demitiu o ministério e José Bonifácio passou à
oposição. Após o fechamento da Constituinte, em 11 de novembro de 1823, José
Bonifácio foi banido e se exilou na França por seis anos. De volta ao Brasil, e
reconciliado com o imperador, assumiu a tutoria de seu filho quando Pedro I
abdicou, em 1831. Permaneceu como tutor do futuro imperador até 1833, quando
foi demitido pelo governo da Regência.
Era
difícil perceber o rumo no ano de 1821. A revolução portuguesa apresentava
fachada liberal e expunha como objetivo o estabelecimento de um regime
constitucional. Os brasileiros queriam também liberdade e constituição. Por
isso, até se desmascararem os móveis verdadeiros da revolução portuguesa, houve
confusão no Brasil, e aceitaram mandato de deputado a Lisboa indivíduos de
cunho nativista, antes implicados em revoluções contra a metrópole.
Descobriu-se, mais tarde, que a revolução portuguesa imporia, caso vitoriosa, a
supremacia econômica e política da antiga metrópole.
Mas,
enquanto isso, iam-se formando em todas as províncias juntas governativas
provisórias. Em São Paulo, em 12 de março de 1821, o governador e
capitão-general João Carlos Augusto de Oyenhausen-Gravenburg anunciou o regime
constitucional. Para dar os primeiros passos, José Bonifácio aceitou convite
para presidir à eleição dos membros, e propôs que fosse por aclamação. Indicou
Oyenhausen como presidente do governo provisório, recebeu aclamação de seu
próprio nome como vice-presidente e, como um dos secretários (eram três, do
Interior e Fazenda, da Guerra e da Marinha), foi indicado seu irmão Martim
Francisco. Em 23 de junho de 1821, José Bonifácio iniciava seu papel político
no Brasil.
Enquanto
as demais juntas governativas se deixavam atrair por Lisboa e viam o Rio de
Janeiro com desconfiança, a Junta de São Paulo foi a primeira a reconhecer a
autoridade do príncipe regente D. Pedro de Alcântara. Em carta de 17 de julho
de 1821 ao pai, o príncipe menciona José Bonifácio como o homem "a quem se
deve a tranquilidade atual da província de São Paulo". Foram eleitos seis
deputados paulistas à Constituinte em Lisboa, entre eles Antônio Carlos, recém
saído da prisão e que se revelaria grande orador em Lisboa; o padre Diogo
Antônio Feijó, mais tarde regente; Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, depois
senador e regente em 1831. Os seis deputados receberam do governo instruções na
forma de um documento coletivo, intitulado Lembranças e Apontamentos, programa
completo em que as necessidades primordiais do Brasil eram postas em foco. No
documento estavam as principais ideias de José Bonifácio.
A
parte mais desenvolvida dizia respeito ao Brasil, em doze itens:
estabelecimento de um governo geral executivo, a cuja autoridade ficassem
sujeitos os governos provinciais, definidos os limites da subordinação; a
instrução pública, aumentando o número de escolas e criando pelo menos uma
universidade; o desenvolvimento do povoamento do interior; a catequese e
civilização dos índios, ou seja, sua integração; a emancipação gradual dos
escravos e a proibição do tráfico; a alteração da estrutura fundiária, com a
reintegração ao domínio do poder público das terras improdutivas. José
Bonifácio era contrário tanto à escravidão quanto ao latifúndio e, nesse ponto,
chocou-se com os poderosos interesses dos grandes proprietários e dos
traficantes. Outra sugestão foi a fundação de uma cidade central no interior do
Brasil, como efetivamente foi depois realizado no século XX com Brasília, para
assento do governo nacional; sugeria ainda uma nova legislação sobre o regime
de terras, pois as chamadas sesmarias, verdadeiros latifúndios, eram uma forma
de exploração antieconômica e antissocial; e os deputados foram advertidos para
incentivar um novo surto de mineração. Contudo, nada do que continha o
documento seria aproveitado no trabalho das Cortes portuguesas. Dos 70
deputados brasileiros, apenas 50 chegaram a exercer mandato. O programa
paulista era contrário ao que pretendiam as Cortes e, percebendo que o governo
do Príncipe Regente no Rio seria o melhor instrumento de que poderiam servir-se
os patriotas brasileiros, resolveram anulá-lo.
Em
fins de maio de 1821 chegaram de Lisboa as bases da Constituição ali promulgada
a 10 de março. A tropa portuguesa, que aderira à revolução do Porto e se
tornara perturbadora da ordem fez, a 5 de junho, um pronunciamento, e obrigou
D. Pedro, a princípio relutante, a jurar as bases. O impulso definitivo para a
emancipação brasileira foi dado pela obstinada política recolonizadora das
Cortes. As medidas tomadas em Lisboa tinham o mesmo objetivo: desunir e
desarticular o Brasil, fazê-lo novamente colônia. E o maior perigo, percebido
por José Bonifácio, era o sacrifício da unidade brasileira. A Junta Governativa
da Bahia, por exemplo, com predominância de interesses comerciais portugueses e
forte presença de tropa lusa, recusava obediência ao Príncipe Regente e se
subordinava a Lisboa e às Cortes. Em Pernambuco se esperava algo mais radical,
a adoção de um governo republicano. À dispersão geográfica se somava o
desentendimento político. Desde outubro de 1821, os patriotas do Rio de Janeiro
queriam proclamar a independência do Brasil, com o príncipe D. Pedro feito
imperador. E este os advertiu do "delírio" que os empolgava e
declarou-se pronto a morrer por "três divinais coisas - a Religião, o Rei,
a Constituição".
Em
9 de dezembro de 1821, porém, chegaram ao Rio os textos dos últimos atos das
Cortes que criavam governos provinciais anárquicos e independentes, mas
sujeitos a Portugal, determinando o regresso quanto antes de D. Pedro para uma
viagem, incógnito, aos reinos de Espanha, França e Inglaterra. Nada mais
poderia manter a ilusão da continuidade do sistema de reino unido. As Cortes
pretendiam anular a obra de D. João VI, fazendo de cada província brasileira
uma província de Portugal.
O
príncipe regente chegou a rascunhar um manifesto de despedida aos brasileiros.
Mas já estava em curso uma ativa campanha, do clube da resistência na casa de
José Joaquim da Rocha, e o príncipe foi mudando de atitude. Nas províncias,
especialmente São Paulo e Minas Gerais, os atos recolonizadores produziam
reação idêntica à do Rio. Começaram a receber assinaturas para uma
representação em que se pedia ao príncipe ficar no Brasil. Para José Bonifácio,
chegara a hora das grandes decisões e de uma ação enérgica para que o Brasil
não se esfacelasse. A carta do Governo de São Paulo ao príncipe regente, datada
de 24 de dezembro de 1821, é de sua autoria. Sobre a carta, disse Octávio
Tarquínio de Sousa: "Se o tom é de violência, justificavam-na sua
indignação e sua revolta, e era necessária para que D. Pedro sentisse
claramente a disposição em que estavam os brasileiros de não mais se deixar
dominar por Portugal." Seu pedido ao príncipe era quase uma ameaça:
"É impossível que os habitantes do Brasil que forem honrados e se prezarem
de ser homens, e mormente os paulistas, possam jamais consentir em tais
absurdos e despotismos. V. A. Real deve ficar no Brasil quaisquer que sejam os
projetos das Cortes Constituintes não só para nosso bem geral mas até para a
independência e prosperidade futura do mesmo Portugal. Se V. A. Real estiver (o
que não é crível) pelo deslumbrado e indecoroso decreto de 19 de setembro, além
de perder para o mundo a dignidade de homem e de príncipe, tornando-se escravo
de um pequeno número de desorganizadores, terá também que responder, perante o
céu, do rio de sangue que decerto vai correr pelo Brasil". A carta chegou
às mãos do príncipe no Rio a 1º de janeiro de 1822. Foi divulgada imediatamente
por D. Pedro, e mandada imprimir na Gazeta do Rio, em 8 de janeiro. Em carta ao
pai, de 2 de janeiro de 1822, D. Pedro escreveu: "Farei todas as
diligências por bem para haver sossego, e para ver se posso cumprir os decretos
124 e 125, o que me parece impossível, porque a opinião é toda contra, em toda
a parte".
O ano de 1822
D.
Pedro, no início de 1822, já tinha clara consciência do papel que os patriotas
brasileiros lhe destinavam, e estava disposto a desempenhá-lo. No dia 9 de
janeiro, quando José Clemente Pereira, presidente do Senado da Câmara do Rio,
lhe entregou a representação fluminense, tentou adiar a resposta mas acabou
declarando: "Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou
pronto: diga ao povo que fico!".
Por
sua vez, José Bonifácio chegou ao Rio a 17 de janeiro, na representação
paulista. Foi nessa ocasião que se entreteve na fazenda de Santa Cruz com a princesa
D. Leopoldina. O príncipe de 23 anos o nomeou, aos 60 anos, seu Ministro e
Secretário de Estado dos Negócios do Reino - o primeiro brasileiro a ocupar um
cargo semelhante - demitindo Marcos de Noronha e Brito. Disse Octávio Tarquínio
de Sousa: "Não estava mais em idade de contentar-se com a simples
aparência das coisas, nem o enganavam palavras, por mais prestigiosas que
fossem". Suas ideias estavam esboçadas nas instruções feitas para os
deputados paulistas às Cortes, e atacavam os problemas sociais e econômicos.
Queria uma organização democrática, queria governo responsável, sistemas
representativos, garantias constitucionais. Mais importante que tudo era a
preservação da ordem pública - pois a tropa portuguesa se passara para Niterói.
A
21 de janeiro, José Bonifácio ordenou ao desembargador do paço chanceler-mor
que não mais fizesse a repartição das leis vindas de Portugal sem antes as
submeter ao príncipe regente. E, a 30 de janeiro de 1822, concitava os governos
provisórios de todas as províncias a promoverem a união das mesmas com sujeição
à regência de D. Pedro. Decreto de 22 de fevereiro de 1822, referendado por
José Bonifácio, convocou a Junta de Procuradores das províncias. Já começava a
ter problemas com certo grupo de políticos do Rio de Janeiro: Joaquim Gonçalves
Ledo, Januário da Cunha Barbosa e José Clemente Pereira apareciam a seus olhos
como demagogos e agitadores que só queriam precipitar os acontecimentos.
A
José Bonifácio se deve seguramente a adesão de D. Pedro ao movimento
emancipador. E sua orientação foi fundamental para que este se desse sem
transbordamentos inúteis, sem choques. Como medida preliminar, entendia-se
necessária a união das províncias - mas no Pará, na Bahia, no Maranhão, não
faltava quem quisesse continuar na dependência das Cortes. A posição de
Pernambuco parecia-lhe ambígua. Sua primeira atitude foi assegurar a adesão
efetiva de Minas Gerais e por isso fez o Príncipe Regente viajar para lá. Essa
viagem serviu para uma radical transformação de ânimo em D. Pedro. Em sua
ausência, por decreto de 23 de março de 1822, cabia a José Bonifácio como
ministro do Reino a chefia do governo.
Nos
primeiros meses os dois se entenderam tão bem, de modo íntimo e sem etiquetas,
e D. Pedro vinha vê-lo para despachar em sua casa no Rossio Grande (atual Praça
Tiradentes ). Com isso, despertaram ciúmes no grupo de patriotas cariocas, que
desejavam influência, entrar para o governo, manejar o poder. Esse grupo foi o
indutor de que o título de "protetor e defensor perpétuo do Brasil"
fosse oferecido a D. Pedro e, a 13 de maio de 1822, dia de gala e beija-mão do
povo por ser o do aniversário do rei D. João VI, D. Pedro aceitou ser aclamado
"defensor", mas disse que "o Brasil não precisava de sua
proteção e a si mesmo se protegia". A iniciativa foi tomada à revelia de
José Bonifácio.
O
problema seguinte do ministro do Reino foi a convocação de uma Assembleia
Constituinte, ideia de todos os patriotas - e desde 3 de abril de 1822, carta
do príncipe regente a José Bonifácio a considerava "o único açude que
possa conter uma corrente tão forte". José Bonifácio não seria em
princípio contrário, mas hesitava decerto acerca de sua oportunidade. Preferia,
antes assegurar a unidade nacional, firmar a solidariedade das províncias, e
temia o que chamava "as desordens das Assembleias Constituintes".
Mas,
as Cortes continuavam em seu propósito de fazer o Brasil voltar à situação
colonial, sentia a necessidade de uma ação imediata. Fez-se, então, uma
representação a D. Pedro, em 23 de maio, para que a convocasse sem demora. Dois
dias antes, o príncipe regente escrevia ao pai: "As leis feitas tão longe
de nós, por homens que não são brasileiros e não conhecem as necessidades do
Brasil, não poderão ser boas". Mas, ao receber a representação, teve palavras
moderadas, dilatórias, que devem ter-lhe sido inspiradas por José Bonifácio. No
Rio não escasseavam os elementos reacionários, chamados "pés de
chumbo", gente do comércio e traficantes de escravos, o que estimulava
ardores nativistas e favorecia mesmo o surto de ideias radicais, nitidamente
republicanas ou democráticas puras. Ganhava mais do que nunca ascendência, o
grupo de Gonçalves Ledo à frente, os quais José Bonifácio considerava sôfregos
agitadores.
A
1º de junho, o príncipe regente baixou uma proclamação em que falava da pátria
ameaçada e marcava para 2 de junho a reunião do Conselho dos
Procuradores-Gerais das províncias, para saber o que pensava da constituinte.
Em 24 horas o conselho lhe enviou um requerimento, em que pedia a convocação. A
3 de junho de 1822 foi expedido decreto em que José Bonifácio convocou a
Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, no qual ainda se falava em manter
a integridade da monarquia portuguesa e a união com Portugal.
Mas,
a 15 de junho foi dado outro passo rumo à ruptura com Portugal, pois José
Bonifácio comunicou ao cônsul inglês que mandava admitir nas alfândegas os
navios britânicos, independente do certificado do consulado de Portugal em
Londres, até que fosse nomeado um cônsul do Brasil naquela cidade. Pernambuco
aderiu rapidamente ao príncipe regente, mas na Bahia a situação continuava
séria e, a 15 de junho, D. Pedro enviou carta em que mandava o general Madeira
embarcar sem demora para Portugal. Foi necessário enviar uma expedição contra
ele e, como comandante, José Bonifácio indicou o general francês Pedro Labatut
que já havia submetido a província de Sergipe.
Enquanto
isso, em São Paulo ocorria o golpe que se chamou "a bernarda de Francisco
Inácio", do qual entretanto saíram fortalecidos os Andradas, e Martim
Francisco foi nomeado ministro da Fazenda em 4 de julho de 1822, passando
Caetano Pinto de Miranda Montenegro, Marquês de Vila Real da Praia Grande, para
a recém criada pasta da Justiça. As finanças estavam em estado caótico, e o
novo ministro foi, como em São Paulo, inflexível com os devedores do erário, em
regra os poderosos da terra, habituados a não recolherem aos cofres o que
deviam. A oposição aos irmãos, com isso, só podia crescer.
Guerra da Independência do Brasil
Em
fins de julho chegaram ao Rio notícia de que as insensatas Cortes de Lisboa
enviavam numerosa tropa para dominar o país. José Bonifácio já se entendia
melhor com Gonçalves Ledo e com os membros mais destacados da maçonaria no
Grande Oriente, sobretudo com o general Luís Pereira da Nóbrega de Sousa
Coutinho, nomeado ministro da Guerra desde 27 de junho de 1822. Tomou medidas
da maior gravidade, como a de declarar inimigas as tropas que Portugal mandasse
para o Brasil, por meio do decreto de 1º de agosto, em que D. Pedro se dava
como "regente do vasto Império do Brasil pelo consentimento e
espontaneidade dos povos" e, a bem dizer, declarava guerra a Portugal.
O
decreto e o manifesto que o acompanhava eram já sinal da decisão tomada: a
ruptura completa. Mas eram atos dirigidos ao povo brasileiro. José Bonifácio,
como ministro dos Estrangeiros, preparou o arrazoado em que se baseava o
príncipe para ser levado aos demais povos. Foi ele, juntamente com Gonçalves
Ledo o autor do documento de 6 de agosto de 1822: extenso, imoderado, de
linguagem por vezes inconveniente, onde expunha o legítimo ressentimento por
três séculos de dominação, e avisava ao mundo que os brasileiros não mais
admitiriam a volta ao regime anterior.
Na
cópia enviada a 14 de agosto de 1822 ao corpo diplomático acreditado no Rio,
José Bonifácio explicou a posição do Brasil: "Tendo o Brasil, que se
considera tão livre quanto o reino de Portugal, sacudido o jugo da sujeição e
da inferioridade com que o reino irmão o pretendia escravizar, e passando a
proclamar solenemente a sua independência e a exigir uma assembleia legislativa
dentro do seu próprio território, com as mesmas atribuições que a de
Lisboa…" Desde 12 de agosto estavam nomeando Felisberto Caldeira Brant
Pontes, o futuro marquês de Barbacena, encarregado de negócios junto ao governo
britânico; Manoel Rodrigues Gameiro Pessoa para Paris; e Luís Moutinho para
Washington. Em suas instruções, redigidas por José Bonifácio, o item principal
era a independência do Brasil.
A declaração de Independência
O
príncipe regente, a 14 de agosto de 1822 partiu para São Paulo, cujo governo
reacionário parecia querer desacatar José Bonifácio. Tivera antes sucesso em
sua missão a Minas, pretendia repetir o êxito em São Paulo. Foi bem recebido e,
"com a autoridade que suas estroinices e desmandos só mais tarde
diminuiriam", pôs ordem no governo provincial. Em sua ausência ficara como
regente sua mulher, a princesa D. Leopoldina de Habsburgo, colaboradora da obra
de José Bonifácio. Tinha poderes para, em Conselho de ministros, tomar com o
mesmo as medidas necessárias "ao bem e à salvação do Estado".
Carta de José
Bonifácio a D. Pedro, datada de 1º
de setembro de 1822. Acervo do Museu
Paulista.
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Trecho da carta de José Bonifácio à D. Pedro:"Senhor. O dado está lançado: de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A.R. quanto antes e decida-se, porque irresoluções, e medidas d'água morna, à vista desse contrário que não nos poupa, para nada servem, e um momento perdido he uma desgraça."
No fim de agosto chegaram ao Rio três navios de Lisboa, com notícias de que as Cortes tinham decidido reduzir o príncipe a simples delegado temporário, e apenas nas províncias onde exercia autoridade, com ministros vindos de Lisboa; haviam anulado a convocação do Conselho dos Procuradores das Províncias e mandariam processar todos quantos tivessem procedido contra sua política. O visado era José Bonifácio, tido como o maior responsável pelos acontecimentos. Este recebeu, ao mesmo tempo, carta de seu irmão Antônio Carlos, que estava em Lisboa. E escreveu a D. Pedro: "O dado está lançado e de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A. quanto antes e decida-se, porque irresoluções e medidas d'água morna, à vista desse contrário que não nos poupa, para nada servem e um momento perdido é uma desgraça". Com sua carta seguiram cartas de D. Leopoldina, incitando o marido ao gesto, uma de Antônio Carlos, outra de Henry Chamberlain.
No fim de agosto chegaram ao Rio três navios de Lisboa, com notícias de que as Cortes tinham decidido reduzir o príncipe a simples delegado temporário, e apenas nas províncias onde exercia autoridade, com ministros vindos de Lisboa; haviam anulado a convocação do Conselho dos Procuradores das Províncias e mandariam processar todos quantos tivessem procedido contra sua política. O visado era José Bonifácio, tido como o maior responsável pelos acontecimentos. Este recebeu, ao mesmo tempo, carta de seu irmão Antônio Carlos, que estava em Lisboa. E escreveu a D. Pedro: "O dado está lançado e de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A. quanto antes e decida-se, porque irresoluções e medidas d'água morna, à vista desse contrário que não nos poupa, para nada servem e um momento perdido é uma desgraça". Com sua carta seguiram cartas de D. Leopoldina, incitando o marido ao gesto, uma de Antônio Carlos, outra de Henry Chamberlain.
O
emissário, Paulo Emílio Bregaro, encontrou D. Pedro que voltava de Santos, leu
os papéis, demonstrou sua grande indignação, e, ao encontrar a Guarda de Honra
que o esperava nas margens do riacho Ipiranga, comunicou que as Cortes queriam
"massacrar" o Brasil. Eram quatro e meia da tarde de 7 de setembro de
1822, e o príncipe, num verdadeiro brado, exclamou: "É tempo!
Independência ou morte! Estamos separados de Portugal".
O fim do ano 1822: aclamação e
tumultos
José
Bonifácio, confirmado ministro do Interior e dos Negócios Estrangeiros, foi
tomando providências no novo governo. Por decreto de 18 de setembro, descreveu
as armas e a bandeira brasileira como se mantiveram até 1889. Por outro
decreto, também de 18 de setembro, criou o tope nacional brasileiro, verde e
amarelo. Noutro, concedia anistia geral para todas as passadas opiniões
políticas - mas excluindo dos benefícios aqueles que se achassem presos e em
processo. Pediu, pela primeira vez, demissão quando Ledo inspirou ao imperador
um decreto mandando cessar a devassa em São Paulo.
Mas
D. Pedro, mesmo ligado a José Bonifácio, vinha sofrendo o assédio do grupo de
Gonçalves Ledo, apontado como representante genuíno do sentimento popular. No
dia de sua chegada de São Paulo, D. Pedro foi tomar posse de seu cargo. Não
desejava abandonar José Bonifácio, mas sim, tendo criado fé em seu destino, ganhara
confiança em si mesmo e tinha o intento de ouvir outras opiniões. Em setembro e
outubro de 1822, D. Pedro parecia ter oscilado mais que nunca, com seu
temperamento nervoso, de um lado entre os patriotas, querendo tudo e disputando
a primazia, e do outro, José Bonifácio, procurando chegar aos mesmos fins mas
sem demagogia nem precipitações.
Este
grupo preparou outra ação política importante, a da Aclamação de D. Pedro I, a
12 de outubro de 1822, como imperador constitucional do Brasil. Estipulava-se
uma cláusula do juramento prévio que o novo imperador deveria prestar à
Constituição, a ser redigida por uma Assembleia Constituinte. A essa cláusula,
José Bonifácio se opôs terminantemente, e foi ela a razão de seu rompimento com
o grupo de Gonçalves Ledo. Mas, depois que D. Pedro dissolveu a Constituinte,
passou a exibir uma concubina, criou tribunais de exceção, fez morrer patriotas
na forca, exilou e manteve José Bonifácio no exílio durante seis anos e, mais
do que tudo para os "democratas", outorgou uma Constituição que não
cumpriu. Ledo não figurou entre os liberais que se opuseram ao imperador.
Independência da Bahia
O
momento era grave, pois a Bahia, o Maranhão e o Pará continuavam fora da
comunidade nacional, e havia perigo de uma reação armada de Portugal. José
Bonifácio queria a aclamação de D. Pedro como imperador, mas queria também um
Poder Executivo forte, que assegurasse a ordem, e terminasse a tarefa de unir
as províncias. Temia as assembleias constituintes. Na véspera da aclamação,
José Bonifácio já teria retomado seu ascendente sobre D. Pedro e, a 12 de
outubro, D. Pedro I foi aclamado imperador constitucional do Brasil em meio a
grandes festas, mas sem a cláusula do juramento prévio.
Visconde de Cairu e José Bonifácio, em quadro
do
pintor R. Nunes,disponível na Câmara de
Vereadores de Salvador, Bahia
|
A
apreciação de numerosos historiadores é que, sem ele no governo, a unidade do
Império teria sido preservada com dificuldades muito maiores, e o Brasil,
dividido e dilacerado, não escaparia provavelmente aos transes do caudilhismo e
da tirania militar. Mas houve choques com os irmãos Andrada, a 28 de outubro de
1822, D. Pedro organizou novo gabinete, em que José Bonifácio foi substituído
por José Egídio Álvares de Almeida, o barão de Santo Amaro, seu velho
companheiro em Coimbra na secretaria do Império e Estrangeiros, e Martim
Francisco foi substituído na Fazenda pelo desembargador João Inácio da Cunha.
José
Joaquim da Rocha iniciou um movimento pela volta dos Andradas ao poder, com
intenso trabalho de propaganda, sessões tumultuosas no Senado da Câmara,
manifestações populares - e José Bonifácio voltou, sendo reintegrado em seu
posto por decreto de 30 de outubro de 1822. Tomou medidas rigorosas, como o
exílios. Partiram para o Havre, em 20 de dezembro de 1822, José Clemente
Pereira, o cônego Januário e Pereira da Nóbrega. Gonçalves Ledo conseguiu fugir
para Buenos Aires. Chamou-os todos, em portaria de 11 de novembro, de
"furiosos demagogos e anarquistas".
José
Bonifácio, ministro do Império, a quem cabia portanto dirigir a política
interna, e ministro dos Estrangeiros, ainda foi o responsável pela criação de
uma Marinha de Guerra. Caldeira Brant enviou-lhe de Londres cerca de 400
marinheiros e oficiais ingleses, postos à disposição de Thomas Cochrane, ávido
e experiente lobo-do-mar sem muitos escrúpulos, conde de Dundonald, feito mais
tarde Marquês do Maranhão e que se encontrava no Chile, a cuja marinha servia.
Cochrane foi contratado pelo governo imperial para fazer guerra no mar aos
portugueses e às Juntas Governativas das províncias do Piauí, Maranhão e do
Grão-Pará até então refratárias à separação. O governo da Província Cisplatina
capitulava, por D. Álvaro da Costa, em 18 de novembro de 1823. No final deste
ano todas as províncias estavam integradas politicamente no novo império.
Medida
de guerra foi ainda o decreto de 11 de dezembro de 1822, em que José Bonifácio
ordenou o sequestro de todas as mercadorias nas alfândegas do Império de
propriedade de portugueses, as que estivessem em mãos destes, os prédios
rústicos e urbanos, as embarcações pertencentes a súditos de Portugal. Outro
decreto, de 30 de dezembro de 1822, elevou para 24% os direitos de importação
de mercadorias portuguesas, equiparadas assim às dos demais países do mundo,
salvo as da Inglaterra que, por força do tratado de 1810, continuavam a pagar
15%.
José
Bonifácio, que não usava escravos em suas propriedades, escrevera ao mesmo
Caldeira Brant desde outubro de 1822, pedindo para o Brasil trabalhadores
rurais ingleses, para estabelecê-los no Brasil. Vieram cerca de 250, como a 16
de janeiro de 1823 comunicou Caldeira Brant, inicialmente pelo navio Lawpin.
A Assembleia Constituinte
1823
foi o grande ano da Constituinte. Um decreto de 14 de abril fixou para 17 do
mesmo mês e ano a primeira reunião preparatória e, a 3 de maio, a abertura
definitiva. A opinião de José Bonifácio estava expressa na frase que D. Pedro I
pronunciou em sua coroação, na cerimônia pomposa e teatral em 1º de dezembro de
1822: "Com a minha espada defenderei a pátria, a nação e a Constituição,
se for digna do Brasil e de mim". Era a advertência aos deputados, como o
resto de sua fala, a que não perpetrassem apenas uma obra de teóricos e
sonhadores. Para José Bonifácio, o mandato dos constituintes não era irrestrito,
a forma de governo fora predeterminada: uma monarquia constitucional.
Num
Brasil com um milhão de escravos numa população total inferior a quatro
milhões, mal saído da opressão colonial, sem escolas, sem universidades, em que
até 15 anos atrás não se admitia a existência de um prelo, de um jornal, a
assembleia congregava muitos homens de valor - mas todos inexperientes em
assuntos de técnica parlamentar e legislativa. A posição do governo se tornou
menos cômoda. Surgiram logo os protestos liberais, o governo mantinha gente nas
prisões sem culpa formada, ordenava deportações, coagia a imprensa. Formou-se
na Constituinte uma oposição aguerrida, e José Bonifácio não possuía os dons
necessários de convencimento, era mau orador, com timbre de voz antipático, não
se preocupava em ser amável, não disfarçava certo tom arrogante. "Por não
ser mais sereno, carrega hoje culpas que não lhe cabem", concluiu Octávio
Tarquínio de Sousa, como o atentado de que foi vítima o jornalista Luís Augusto
May. Enquanto isso, D. Pedro passou a acreditar em todos os elogios, em todos
os louvores, acreditando-se o herói único, autor exclusivo da independência.
José
Bonifácio caiu após um episódio que envolveu o padre Francisco Muniz Tavares,
deputado por Pernambuco, sobre a situação dos portugueses no Brasil. O projeto
de deportação não vingou, mas deu ensejo a que se dissesse o que não deveria
ter sido dito. O imperador decidiu afastar seu ministro e demiti-lo por uma
questiúncula de política regional paulista. José Bonifácio se considerou
demitido na noite de 15 de julho de 1823. Seu substituto foi José Joaquim
Carneiro de Campos, depois Marquês de Caravelas. Solidária, demitiu-se também
sua irmã Maria Flora Ribeiro de Andrada das funções de camareira-mor da
imperatriz.
Sobre
este episódio comenta Maria Graham: …"a
renúncia de José Bonifácio é certa, e não menos certa a de seu irmão Martim
Francisco, cuja honestidade irrepreensível à frente do Tesouro não será
facilmente substituída. (…) A ideia mais geral é a de que os Andradas foram
sobrepujados por um partido republicano da Assembleia. (…) Entrementes José
Joaquim Carneiro de Campos é o primeiro-ministro e Manuel Jacinto Nogueira da
Gama está à testa do Tesouro; homem bastante rico para ficar acima de qualquer
tentação cujo caráter, quanto à integridade, está escassamente abaixo de seu
predecessor.""
Em
uma entrevista dada em 5 de setembro de 1823 a O Tamoyo, jornal por ele fundado
em agosto de 1823 após sua demissão do governo, e que só viveu três meses, ele
explicou suas ideias, abriu seu coração. O homem público estava intacto, cheio
de interesse pela política. Não podia afastar-se da Corte, pois era deputado à
Constituinte, mas lutaria contra o que não lhe agradava. A 1º de setembro de
1823 foi lido o projeto de Constituição, com 272 artigos, do qual Antônio Carlos,
seu irmão, era o relator e autor principal. Era francamente liberal, e criava
um poder executivo forte, delegado ao imperador. Mas havia no seio da
assembleia já quatro ou cinco grupos. E, em Portugal, um golpe absolutista
contra as desastradas Cortes investira novamente D. João VI na plenitude dos
poderes do Estado. Portugueses e reacionários começavam no Brasil a levantar a
cabeça.
O
imperador ia aos poucos cedendo, e o elemento militar luso ia-se infiltrando no
exército, tornando-se perigoso e insolente. A campanha dos que se intitulavam
os patriotas continuava, nacionalista e antiportuguesa. Houve discursos de
grande exaltação em novembro de 1823, depois do episódio com o boticário Davi
Pamplona Corte Real. O imperador refez então seu gabinete com gente incolor ou
reacionária. Francisco Vilela Barbosa, depois Marquês de Paranaguá, chegado há
pouco de Portugal, foi escolhido novo ministro do Império. A tropa passou a
exigir restrições à liberdade de imprensa e a expulsão dos Andradas da
Assembleia. A dissolução da Constituinte tornou-se inevitável.
Segundo
Maria Graham "a verdadeira causa do
desprestígio de José Bonifácio estava na amante do Imperador e no Plácido.
Suponho que estão vendidos ao partido português, afirma - sendo eles próprios
pés de chumbo." (…) Quando os Andradas foram deportados, foi uma
inglesa, Mrs. Chamberlain, senhora do cônsul inglês no Rio, que obteve licença
para que suas esposas pudessem acompanhá-los.
José
Bonifácio foi preso em casa e levado para a Fortaleza da Laje, após o golpe de
força da dissolução da Assembleia pelo imperador, em 12 de novembro de 1823.
Não haveria nova Constituinte - D. Pedro I outorgaria uma Constituição a 24 de
março de 1824, sendo esta uma adaptação do anteprojeto de Antônio Carlos, em
curso na Assembleia Constituinte dissolvida.
Condenado
ao exílio, deixou o Rio de Janeiro numa velha charrua, chamada Lucônia, a 20 de
novembro de 1823, comandada pelo português Joaquim Estanislau Barbosa, com
destino ao Havre. Após um motim durante a viagem, pararam em Vigo, na Espanha,
a 12 de fevereiro, e quase foram apresados por navios portugueses, escapando
graças à intervenção do cônsul da Inglaterra, que o procurou a bordo. Seguiram
por terra para Corunha, e de barco para Bordéus, onde desembarcaram a 5 de
julho.
Exílio e retorno
Banido,
José Bonifácio foi residir em Talence, a quatro quilômetros de Bordéus, com sua
família. Viveria no exílio dos 61 aos 66 anos. Martim Francisco e Antônio
Carlos moravam também em Bordéus. Neste período renasceu nele o trabalhador
intelectual, o homem de estudos. E a "solidão do campo", como
escreveu a amigos, lhe trouxe "a mania antiga de poeta". Traduziu
Virgílio e Píndaro, compôs, e em 1825, sob o pseudônimo arcádico de Américo
Elísio, publicou em Bordéus as Poesias avulsas, gastando nisso 500 francos. Não
era bom poeta, nem poeta original.
As
notícias do Brasil não o podiam deixar contente. D. Pedro I, a 25 de março de
1824, outorgada a Carta Constitucional, fora implacável ao abafar o movimento
revolucionário do Nordeste, conhecido como Confederação do Equador, nascido da
dissolução da Assembleia.
"O partido português havia
assumido tal importância em setembro de 1824 que o mais leve sinal de
inteligência num ministro brasileiro o derrubaria. Todos os oficiais do
palácio, as mulheres inclusive são portugueses ou franco-lusitanos."
Preocupavam-no
sobretudo as negociações para o reconhecimento da independência, com Portugal e
a Inglaterra, que se arrastaram até agosto de 1825. O fato de o Brasil aceitar
pagar dois milhões de esterlinas a Portugal lhe pareceu mais uma "carta de
alforria" do que o reconhecimento. Foi impiedoso com D. João VI, a quem
chamou de "João Burro", e com D. Pedro, a quem comparou a Pedro
Malasartes. Considerava um insulto que D. Pedro tivesse outorgado a sua amante
Domitília de Castro e Canto Melo o título de Viscondessa de Santos, justamente
a cidade em que nascera.
Em
maio de 1826 foi instalada a primeira Assembleia Legislativa brasileira. D.
Pedro I não agiu imparcialmente na escolha dos senadores, nem se deveria esperar
isso dele. Morreu o rei D. João VI e D. Pedro lhe sucedera no trono português.
Porém, ele outorgou uma Carta, decretando anistia geral e abdicando em favor de
sua filha D. Maria da Glória, futura D. Maria II. Enquanto isso, a devassa
aberta contra os Andradas se eternizava em São Paulo, avançando até 1828, e
José Bonifácio permanecia em Bordéus. Neste período foi duas vezes votado como
deputado pela Bahia. Antônio Carlos e Martim Francisco conseguiram autorização
para o regresso e deixaram Bordéus a 26 de abril de 1828, sendo recolhidos à
Fortaleza da Ilha das Cobras, no Rio, a 4 de julho, e a 6 de setembro de 1828
lograram absolvição e liberdade.
Em
1829 foi permitido a José Bonifácio retornar ao Brasil. Chegou ao Rio de
Janeiro a 23 de julho, carregando o cadáver da esposa, morta na viagem. O
ministro do Império era seu adversário José Clemente Pereira, e o dos
Estrangeiros o marquês de Aracati, seu companheiro no governo provisório de São
Paulo e depois também adversário. A situação política não era das melhores,
pois o imperador não se entendia com o Poder Legislativo, não escolhia
ministros que desfrutassem do apoio dos deputados, entre os quais havia quem
quisesse estabelecer o parlamentarismo à inglesa. O Primeiro Reinado vinha se
caracterizando por uma constante instabilidade política e social. José
Bonifácio teria grandes dúvidas sobre a campanha liberal dirigida por Bernardo
Pereira de Vasconcelos, Evaristo da Veiga e outros. Generoso, perdoava ao que
chamava por vezes o Rapazinho, e D. Pedro o recebeu com alegria. Com o marquês
de Barbacena, que desembarcara no Rio em 16 de outubro de 1829 trazendo a nova
imperatriz D. Amélia de Leuchtenberg, sempre se entendera bem. Mas seus
inimigos não o deixavam descansar e, já em março de 1830, foi acusado de estar
metido em uma conspiração republicana, como insinuou o Diário Fluminense. Vivia
então retirado na ilha de Paquetá.
Tutor dos príncipes
Com
a abdicação de D. Pedro I em 7 de abril de 1831, José Bonifácio foi por ele
nomeado tutor de seu filho de cinco anos, o futuro D. Pedro II. Mau marido, o
imperador foi um pai dedicado e enternecido - e de todos os filhos, legítimos
ou não. O imperador assinou um decreto em que nomeava "tutor dos meus
amados e prezados filhos ao muito probo, honrado e patriótico cidadão José
Bonifácio de Andrada e Silva, meu verdadeiro amigo". No dia 8 de abril,
José Bonifácio foi ao palácio da Boa Vista visitar os pupilos. Tinha 68 anos e
seu temperamento e seu feitio não prometiam um tutor ideal. Ainda apareceria na
Câmara dos Deputados, pois era suplente de Honorato José de Barros Paim.
Prestou
juramento perante o Senado como tutor eleito pela Assembleia a 19 de agosto de
1831. A lei de 12 de agosto de 1831 regulava suas funções, e não lhe cabia
senão nomear mestres e mordomos. Manteve Luís Aleixo Boulanger para lhes
ensinar escrita, primeiras letras e geografia; o cônego Renato Pedro Boiret
para mestre de francês; Simplício Rodrigues de Sá, de desenho; Lourenço
Lacombe, de dança; Fortunato Mazzioti, de música. Acabou brigando com D.
Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho, a quem os príncipes consideravam
uma segunda mãe, e que não teria pequena parte na campanha movida contra ele.
Logo
se tornou suspeito ao governo. O ministro da Justiça Diogo Antônio Feijó, que
abafara dois graves levantes armados no Rio em 1831 e 1832, se convenceu de que
José Bonifácio tivera parte no último, e o acusou formalmente. Em 1833, o
grande temor era a volta de D. Pedro I, a restauração, um golpe
"caramuru". Antônio Carlos fora mesmo à Europa para convencê-lo a
retornar. A Aurora Fluminense, de Evaristo da Veiga, acusava o tutor de falta
de compostura, comentando dois bailes dados no paço. Finalmente, José Bonifácio
foi suspenso do cargo pelo decreto de 14 de dezembro de 1833, por ato cujo
verdadeiro autor era o ministro da Justiça Aureliano Coutinho, depois visconde
de Sepetiba, que escreveu à D. Mariana de Verna: "Parabéns, minha senhora. Custou, mas demos com o colosso em
terra".
Eles
estavam enganados; José Bonifácio resistiu, com energia a diversos juízes de
paz que foram ao paço levar seu decreto de suspensão, pois não o considerava
legal. E escreveu ao ministro do Império: "Cederei à força, que não a
tenho". Para arrancá-lo, mobilizou-se a tropa e foi lavrada contra ele
ordem de prisão. O governo prendeu-o em casa, na ilha de Paquetá. Em seu lugar
foi nomeado Manuel Inácio de Andrade Souto Maior Pinto Coelho, o marquês de
Itanhaém.
Segundo
Maria Graham, uma inglesa contemporânea, não havia lugar em que se pudesse passar
meia hora com mais prazer e proveito do que na família "deste
ex-ministro". "Sua mulher é de
origem irlandesa, uma O'Leary, senhora da maior amabilidade e gentileza,
realmente admiradora do valor e do talento do marido. (…) Mas é o próprio José
Bonifácio que me desperta maior interesse. É um homem pequeno, de rosto magro e
pálido. Suas maneiras e sua conversa impressionam logo o interlocutor com a
ideia daquela atividade incansável e que mais parece consumir o corpo em que
habita. (…) via-se logo que era muito popular entre a gente pequena. Para
comigo, como estrangeira, foi da maior cerimônia ainda que delicadamente
polido, e conversou sobre todos os assuntos e de todos os países."
José
Bonifácio abandonou a vida política e passou o restante de seus dias em
reclusão, em sua casa na ilha de Paquetá, dentro da Baía de Guanabara. Morreu
ali perto, em Niterói, aos 75 anos. Seu cadáver, embalsamado, foi levado três
dias depois para o Rio de Janeiro, depositado na Igreja da Ordem Terceira de
Nossa Senhora do Carmo, onde ficou exposto até o dia 25 de abril. Nessa data,
sua filha D. Gabriela Frederica Ribeiro de Andrada o levou para Santos,
sepultando-o na capela-mor da Igreja Nossa Senhora do Carmo, segundo disposição
testamentária.
Deixou
poucos bens, mas sua biblioteca contava com seis mil volumes.
Gabriela
Frederica e os filhos (filha de José Bonifácio, casou-se com o tio Martim
Francisco)
Atualmente,
os seus restos mortais jazem ao lado dos despojos de seus ilustres irmãos,
Antônio Carlos, Martim Francisco e o padre Patrício Manuel, num monumento
situado em Santos, na Praça Barão do Rio Branco 16, denominado Panteão dos
Andradas, inaugurado no dia 7 de setembro de 1923.
José
Bonifácio casou em Lisboa em 31 de janeiro de 1790, na igreja de Nossa Senhora
da Lapa, com uma senhora irlandesa, Narcisa Emília O'Leary, que lhe deu duas
filhas.
A figura de José
Bonifácio no Monumento da
Independência, de autoria do escultor Ettore Ximenez,
que se ergueu nos anos 20 na "Colina do Ipiranga",
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Filhas
Carlota
Emília, que casou com Alexandre Antônio Vandelli, auxiliar do sogro desde 1813
na Intendência-Geral das Minas e Metais e na Academia das Ciências.
Gabriela
Frederica Ribeiro de Andrada que, em 15 de novembro de 1820, casou em Santos
com seu tio, Martim Francisco Ribeiro de Andrada.
Voltando
ao Brasil trouxe uma filha bastarda, Narcisa Cândida, assim batizada em
homenagem à esposa.
A Maçonaria
José
Bonifácio, teve lugar de destaque na história da Maçonaria do Brasil como um
dos principais fundadores. Foi o primeiro Grão-Mestre do Grande Oriente do
Brasil sendo empossado em 19 de julho de 1822, cargo o qual exerceu por duas
oportunidades. Exerceu ainda o cargo de Soberano Grande Comendador do Supremo
Conselho que é a mais alta hierarquia, responsável pelos maiores graus da Ordem
Maçônica.
Obras
Sobre
as minas de carvão-de-pedra em Portugal, publicado no Patriota, Rio de Janeiro,
1813
Há
terrenos que pelo arado não dão fruto, mas sendo cavados com o picão sustentam
mais do que se fossem férteis, memória, publicada no Patriota, Rio de Janeiro,
1813
Experiências
químicas sobre a quina do Rio de Janeiro, comparada com outras, 1814
Memória
minerográfica da serra que decorre de Santa Justa até Santa Comba e suas
vizinhanças na província do Minho, Museu Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc.
290, 1814-1815
Sobre
a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal,
particularmente de pinhais nos areais de beira-mar; seu método de sementeira,
custeamento e administração, 1815
A
primavera, 1815
Memória
sobre a nova mina de ouro da outra banda do Tejo, chamada Príncipe Regente,
1817
Memória
sobre as pesquisas e lavra dos veios de chumbo de Chacim, Souto, Ventozello, e
Villar de Rey na província de Trás-os-Montes, 1818
História
da Academia Real das Ciências de Lisboa, para o ano de 1818, discurso histórico
recitado na sessão de 24 de junho de 1818
Memória
econômica e metalúrgica, sobre a fábrica de ferro em Sorocaba, que visitaria
por segunda vez em 1821, com duras críticas à "má administração antiga e
nova", aos "abusos e ladroeiras", o que iria suscitar a má
vontade, a ira e a vingança do filho do diretor, o historiador Varnhagen, 1820
Poesias
avulsas, 1825
Memória
minerográfica sobre o distrito metalífero entre os rios Alva e Zêzere, Museu
Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc. 291., s/d